ORAR OU REZAR: ONDE ESTÁ A QUESTÃO?


Alguns cristãos ficam confusos quando se dirigem a Deus por não terem a certeza se estão orando ou rezando. Será que existe realmente uma diferença fundamental entre estas duas palavras: “rezar” e “orar”? Muitos crentes estão convictos que sim. Para eles orar é dirigir-se diretamente a Deus sem a mediação de fórmulas humanas de oração, seja ela de qual natureza for. E rezar (falsa oração) é utilizar fórmulas devocionais, orações escritas para tentar falar com Deus e manipular a sua vontade. E nos perguntamos: será que quando o Povo de Deus usava os salmos (livro de orações do Antigo Testamento) para orar ao Senhor Javé estaria alienando seu relacionamento íntimo com Deus?


É triste observar a confusão que fazem com o significado dos vocábulos rezar e orar. Segundo o dicionário da língua portuguesa Aurélio Eletrônico – Século XXI (edição 1999), de Aurélio Buarque de Holanda, rezar significa: dizer ou fazer (oração ou súplica religiosa); ler (livros de orações); conter escrito; mencionar, dizer, referir; prescrever, determinar, preceituar; celebrar; fazer bezenduras em; benzer. E orar significa: fazer oração; rezar; discursar em público; proferir discursos; falar em tom oratório; dirigir oração; suplicar em oração; pedir, suplicar, rogar; fazer (prece). Portanto, são palavras sinônimas.

A questão vai além da distinção dos dois termos. Quando os discípulos de Jesus pediram ao Mestre que lhes ensinasse a orar, Ele ensinou-lhes uma fórmula: “Quando orardes dizei: Pai Nosso, que estais no céu ...”(Mateus 6,9). E Jesus não disse: “Diga ao Pai o que está sentido no seu coração e isso basta”. Se houvesse realmente esta diferença entre rezar e orar teríamos que admitir que Jesus não sabia realmente orar, e o que é pior, ensinou um modo errado de orar aos seus discípulos fazendo-os rezar. Jesus disse: “Pai Nosso...”. Porém, Ele fez questão de alertar seus discípulos sobre o perigo de transformar a oração (diálogo com Deus) numa experiência de monólogo com nossa própria consciência, tornando a fé desvinculada da vida. É preciso tomar cuidado para não cair na tentação dos pagãos que colocavam sua fé na suas próprias palavras, na logicidade de seus raciocínios vazios de vivência da fé.

Jesus não condena o modo de rezar que utiliza fórmula (textos bíblicos, orações comunitárias, hinos e cânticos), mas um certo tipo de oração que multiplicando as palavras pretende convencer Deus a satisfazer nossos interesses egoístas. Jesus ensina aos seus discípulos que a verdadeira oração é aquela que nasce do coração do homem como clamor, como júbilo, como diálogo entre dois amigos e que chega aos ouvidos do Pai.

O que está por trás deste pseudo-problema é o conceito estreito, reduzido de oração. Não existe um único modelo de oração e nem podemos reduzir a oração a modelos religiosos que codificam a oração em métodos, horários fixos, fórmulas, etc. Em momentos diversos de nossa vida quotidiana podemos experienciar vários modos de nos colocar diante do amor de Deus: suplicando pelas nossas necessidades pessoais e comunitárias; louvando e agradecendo através de cantos os dons gratuitamente recebidos; silenciando diante do grande mistério trinitário; deixando falar Deus no silêncio da dor e do abandono; pedindo perdão através de gemidos, lágrimas e arrependimento do pecado cometido contra Deus e contra os nossos irmãos. A oração é mais do que um gesto, um momento, um lugar: a oração envolve toda a minha vida: “façam tudo para a glória de Deus” (1Cor 10,30).

Concluindo, devemos insistir na qualidade da experiência de oração do crente, do fiel. O orante é convidado a rezar com fé, com confiança e total abandono diante do mistério da presença dialogante de um Deus que ama e quer salvar toda a humanidade.

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